Chove a cântaros, potes, baldes, tonéis e barricas. E eu aqui, prisioneiro, ao lado de Schopenhauer. Não podia ser a Fanny Ardant?
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Chove a cântaros, potes, baldes, tonéis e barricas. E eu aqui, prisioneiro, ao lado de Schopenhauer. Não podia ser a Fanny Ardant?
CASO PLUVIOSOCarlos Drummond de AndradeA chuva me irritava. Até que um diadescobri que maria é que chovia.A chuva era maria. E cada pingode maria ensopava o meu domingo.E meus ossos molhando, me deixavacomo terra que a chuva lavra e lava.Eu era todo barro, sem verdura…maria, chuvosíssima criatura!Ela chovia em mim, em cada gesto,pensamento, desejo, sono, e o resto.Era chuva fininha e chuva grossa,matinal e noturna, ativa…Nossa!Não me chovas, maria, mais que o justochuvisco de um momento, apenas susto.Não me inundes de teu líquido plasma,não sejas tão aquático fantasma!Eu lhe dizia em vão – pois que mariaquanto mais eu rogava, mais chovia.E chuveirando atroz em meu caminho,o deixava banhado em triste vinho,que não aquece, pois água de chuvamosto é de cinza, não de boa uva.Chuvadeira maria, chuvadonha,chuvinhenta, chuvil, pluvimedonha!Eu lhe gritava: Pára! e ela chovendo,poças dágua gelada ia tecendo.Choveu tanto maria em minha casaque a correnteza forte criou asae um rio se formou, ou mar, não sei,sei apenas que nele me afundei.E quanto mais as ondas me levavam,as fontes de maria mais chuvavam,de sorte que com pouco, e sem recurso,as coisas se lançaram no seu curso,e eis o mundo molhado e sovertidosob aquele sinistro e atro chuvido.Os seres mais estranhos se juntandona mesma aquosa pasta iam clamandocontra essa chuva estúpida e mortalcatarata (jamais houve outra igual).Anti-petendam cânticos se ouviram.Que nada! As cordas d’água mais deliram,e maria, torneira desatada,mais se dilata em sua chuvarada.Os navios soçobram. Continentesjá submergem com todos os viventes,e maria chovendo. Eis que a essa altura,delida e fluida a humana enfibratura,e a terra não sofrendo tal chuvência,comoveu-se a Divina Providência,e Deus, piedoso e enérgico, bradou:Não chove mais, maria! – e ela parou.
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fany ardant e schopenhauer nao sao incompativeis…la femme d’à coté….)
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Nat, ontem chovia,mas o poema eu desconhecia!Adorei!BjsP.S. Já em Fortaleza?
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Confetti, claro que não são incompatíveis, vc está coberta de razão. Mas ontem eram Schopenhauer e a chuva. Preferia que fossem Fanny Ardant e a chuva! ;-)Bjs
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Oi, Ricardão (!?!). Belo poema né? Sou tarada no Drummond.A partir de hoje em definitivo de volta ao Rio. Deu tudo errado, mas eu tou tentando achar que foi bom ;- )Bjs
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